quinta-feira, abril 30, 2009

VERS&PROSA

Imagem: Derinha Rocha


SHAKESPEREANA
VII
(CONTUMAZ)

Luiz Alberto Machado

Toda sexta-feira meio-dia em ponto, eu chego macorongo pra despranavear.

E ela vem lá com cara indecente, ardilosa e premente a me trucidar.

E chega a catar toda nuínha dizendo que é minha pro que der e vier.

E logo ela quer saltar investida, gemendo a lambida a me delirar.

Com sacolejar, sem-vergonha mais rara, abocanha e dispara meu bloco na rua.

Ela morde a lua e acende meu frevo, eu pego e me atrevo maior cipoada.

Ela cai de bocada e chupa que baba, quando o mundo desaba e eu nem aí.

Eu fico daqui só maré cheia, quando ela negaceia e toda descabela.

Abre toda janela, esfrega e alisa, e me dá uma pisa com todo carinho.

Pede mais um cadinho da minha drupa, não se desgruda nem larga um tiquinho.

E vai de mansinho de oito a oitenta, empina a venta e engole Pernambuco.

Eu fico maluco e arreio a ripa, sacolejo a tripa até fim do cabo.

É assim que me acabo o dia inteiro, mais que banzeiro gozando demais.

E ela quer mais, faminta e taluda enquanto a cascuda só quer explodir.

Então é aí nesse repasto, beijo-lhe grato e torno a beijar.

A me fartar dos seus lábios vermelhos, a língua o seu relho e a boca um manjar.

E grato a ficar, feliz Zé-bedelho, quando ela de joelhos, se põe a rezar. Ah!

sexta-feira, abril 24, 2009

VERS&PROSA



Imagem: Derinha Rocha

SHALESPEREANA

VI

(Teimosia)

Luiz Alberto Machado

Toda sexta-feira, meio dia em ponto, eu armo meu conto e me faço vigário.

Eu domino o cenário, quando nua ela aponta e nem se dá conta que sou perdulário.

Mas pelo contrário, timidez faz de conta na farsa já pronta zoar de falsário.

É que refratário, faço que não quero, enquanto desespero sua languidez.

Não vou de uma vez com sede ao seu pote, vou armando meu bote numa chave em nó cego.

Onde bato meu prego, balanço o badalo e aprumo meu falo na sua roseta.

Ela fica canhestra, de costa emborcada tão fogosa encarnada repetindo o prato.

Não vendo barato e remexe a rabeira toda trampolineira, sestrosa cunhã.

Quando geme o cardan, se contorce rameira feito puta fuleira, manhosa demais.

Eu na tuia, ai ai ai, ela enche a tirrina e vira cabotina amocega corrimão.

E nem vacila não ajeitando o garimpo, deixa o prato limpo, lambuzado nos beiços.

Eu viril ofereço toda légua tirana e soluça que abana, maior teretetei.

É que desenguiçei sua engrenagem azeitada, ainda se estira deitada, pronta pra outro teitei.

Eu nem debreiei e finquei de primeira, lavei a derradeira fazendo escarcéu.

Já virei um tetéu e salivo a fubamba pr´ela já perna bamba, refugar toda ardida.

Mas é outra pedida, o tiro de misericórdia, ela ativa a concórdia a dengar domingueira.

Pois toda sexta-feira, ela chega e destampa, quando não chora na rampa, deixa a tanga voar.

E para encurtar o rebuliço medonho, o maior tiro-ponho pra ela esgoelar.

É que não vou me esquivar de provar gostosura, pois toda formosura ela inteira me dá.

VEJA MAIS:
VERS&PROSA PARA A MENINA AZUL
GUIA DE POESIA
A TERRA: UMA PALESTRA SOBRE A CIDADANIA E O MEIO AMBIENTE
CANTARAU

quarta-feira, abril 22, 2009

VERA SALBEGO



Imagem: Alpha, de Hugo Macedo.

OS VERSOS SENSUAIS DE VERA SALBEGO

ALUCINAÇÃO

Lençois caidos ao chão.
Corpos suados num só ritmo.
Alucinante de paixão.
Boca na boca.
Olhos nos olhos.
Maõs nas mãos.
Pernas entre pernas.
Tudo num só compasso.
Numa emoção.
Num êxtase total.
Dois corpos perdidos.
Na imensidão das madrugadas.
Nos delirios de amor.
De dois amantes
No calor dos corpos.

TEU BRINQUEDO

Naquela noite,
Eu nervosa e tímida
Você soube ultrapassar barreiras.
Fazer cair por terra, preconceitos.
E com suas mãos experientes
Fez do meu corpo, seu brinquedo.
Eu nada sabia do desejo da carne.
Mas, teu corpo soube penetrar minha alma.
Mostrando o encanto do prazer.
Você ficou
E soube
Fazer-me
Feliz!

DOIS CORPOS NUS...

Corpos nus
Sobre a cama com lençóis vermelhos
Corpos belos
Desnudos da imundície do mundo.
Pecado, volúpia
Prazeres, sensualidade.
Nisso tudo dois corpos
Perdidos na imensidão
Da madrugada.
A luz da lua
Iluminando aquelas curvas
Lábios vermelhos
Seios maravilhosos
Cobertos apenas com lençóis.
Esperando as mãos que buscam
Na volúpia de um beijo.

AMOR

Amor é sentimento
Que nasce do coração
Que vem da emoção.
Nasce de um olhar
De um gesto de carinho.
Amor é ternura
Caminhar na mesma direção
Namorar com a luz do luar.
E calar frente ao outro
E deixar o ritmo do coração
Falar mais alto.
Deixar a musica do coração
Penetrar a alma
Deixar os pensamentos
Fluírem para além da imaginação.
Amar é deixar-se abraçar
Sentindo o outro no fundo da alma.

CORPOS SOBRE A AREIA

Dois corpos
que se procuram...
Movidos pelo calor da paixão.
inebriados pelos suspiros do amor.
Unidos,entrelaçados.
Num gozo maior.
Num climax de tesão.
Numa musica que só a noite traz
exalando seu cheiro
suas canções.
Apenas estrelas a contemplar.
Aqueles dois corpos nus.
Na areia da praia.
Envolvidos com o manto do luar.
Num ritmo em que só o amor.
Dita as razões da alma.

NAMORADA

És minha eterna namorada
Que eu tanto amo
E te quero com todo ardor.
Amada, minha.
És a flor mais bela
Da minha existência.
Penso em nós
A todo instante
Como fossemos borboletas
Ao vento
Sobrevoando os jardins da vida.
Colhendo o néctar do amor
Espalhando nosso mel
Para a doçura do nosso olhar.

NO RITUAL DO AMOR

As duas moças passeavam ao redor da pequena praça daquela cidade de Santa Catarina. O grau de amizade era muito forte e cada uma dedicava a outra um amor incondicional. Não sabiam desse sentimento que crescia como relva nos gramados dos jardins.
Naqueles tempos as pessoas eram amigas e havia uma cumplicidade entre elas.
As duas viviam intensamente esse amor amizade e se divertiam entre os bailes e os rapazes que ali freqüentavam.
Até que certo dia uma delas precisa partir, pois seus pais vão se mudar de cidade. O dia da partida chega e as duas não querem se separar, mas o destino o quis.
Bia e Carol abraçadas choram por não saberem quanto tempo ficaram separadas. Seus pais não percebem o quanto elas se gostam.
O carro sai de mansinho levanto sua amiga Carol para longe de seus olhos que ficam umedecidos pela saudade.
Os meses passam rápidos e as amigas continuam telefonando, mandando e-mail não deixa matar esse sentimento forte uma pela outra.
Mas a vida tenta dar uma guinada.
Carol estuda Medicina Estética na Universidade de Santa Catarina e encontra uma nova amiga a Laura.
Laura é uma moça loira de corpo bronzeado, corpo de curvas delineadas belíssima.
Elas agora se encontram para estudar nos recantos da Universidade.
Carol e Laura agora não se separam, vivem uma para a outra e saem juntas para passearem.
Bia sente saudade de sua amada e percebe que a distancia mexeu com seus sentimentos, pois agora não se comunicam mais.
E tenta então ligar para Carol.
_ Querida como tu está?
_Tudo bem contigo?
As duas conversam e Carol lacônica não diz muita coisa.
Despedem-se é Bia fica pensativa.
Bia voltase –se para seus afazeres e percebe que sua amiga já não corresponde aos seus sentimentos. Fica entristecida e continua a viver sua pacata vida.
Enquanto isso Carol vive sua relação com Laura, saciando suas vontades e sua paixão.
Entregam-se ao amor entre duas mulheres e vivem felizes.
Mas certo dia Laura recebe um telefonema de casa pedindo sua presença. Seus pais estão indo embora do pais e querem que ela venha com eles também terminar seus estudos na Itália.
Ela resolve contar ao seu grande amor.
_Querida meus pais me convidaram para ir para a Itália com eles estou pensando em aceitar. Adoraria que você me acompanha-se.
Que achas da idéia.
Carol fala:
-Gostaria muito de ir com você, mas tenho meu ultimo ano na Universidade. Quem sabe no final do ano.
_Amaria se você fosse.
As duas se abraçam e se beijam demoradamente.
Chega o dia da partida e Laura se despede da amiga e se dirige para o avião.
Carol fica então com seus pensamentos e imagina Laura maravilhosa passeando pela Itália naqueles lugares belíssimos.
Os dias passam e Carol liga diariamente para seu amor para matar as saudades e conversam demoradamente sobre suas vidas.
Na Universidade tudo continua igual e as tarefas são muitas fazendo Carol se envolver com seus últimos trabalhos. Seus dias passam lentos mas seus pensamentos buscam Laura no distante da Itália.
Enfim chega o dia da Formatura e Carol feliz recebe seu diploma e percebe que agora esta livre para partir para a Itália para os braços de seu amor.
Chega a casa arruma suas coisas e liga para uma agência de viagem e compra sua passagem para a Itália. Então chega o momento da partida.
Vai para o aeroporto e encontra lá sua amiga de outrora com flores e um sorriso nos belos lábios.
-Bia querida que bom que vieste se despedir.
-Carol vim para desejar uma ótima partida e que você seja feliz. Apesar de eu estar sentindo tristeza não irei atrapalhar tua partida.Vá e seja feliz e se caso não de certo teu relacionamento não esqueça que estarei aqui de esperando.Abraça-se e se despedem.
O avião parte deixando em terra um amor verdadeiro que soube separar seu querer para a felicidade da outra.
Carol chega à Itália e não encontra Laura e fica pensando o que poderia ter acontecido. Pega um táxi e dá o endereço e seguem pelas avenidas daquele belo lugar.O carro chega numa casa toda arborizada e com belas flores nos jardins.
Então Carol desce e toca a campainha.
A porta se abre e ela e recebida pelo mordomo da família de Laura.
-Seja bem vinda senhorita. A família está no quintal tomando chá,por favor siga-me.
Então ela percebe que ali a situação esta diferente e Laura não estava esperando.
-Bom dia diz o pai de Laura.
-Bom dia.
A mãe de Laura de longe observa Carol e então entra na conversa.
-Seja bem vinda filha, Laura não está, mas avisou-nos que você chegaria.
_Aceitas um chá?
-Claro.
A família continuou conversando e tomando chá naquele quintal deslumbrante.
Então chega Laura cheia de carinho para seus pais e se surpreende com Carol.
-Você já chegou amiga.
-Sim eu havia avisado.
-Desculpe surgiu um compromisso de ultima hora e tive que sair.
-Não te preocupa o importante e que eu cheguei.
Daí em diante começaram a viver intensamente seu amor, mesmo em que algumas horas Laura se distanciava de Carol.
Os meses foram passando e Carol percebeu que sua ida para a Itália não estava legal. Tentou arrumar emprego e não conseguiu e Laura com sua linda Clinica fazia sucesso entre as mulheres do lugar.
Laura tinha uma linda Clinica de estética na Itália e dirigia com afinco sua empresa.
Carol foi percebendo o distanciamento de Laura e ficou calada. Começou a visitá-la na Clinica e viu o carinho especial que a médica dispensava a empresária.Carol ficou calada e só observava o comportamento de Laura.
Laura estava fria com ela e pensava somente no trabalho 24 horas por dia.
Já havia passado oito meses que ela chegou e hoje trabalhava numa Clinica tão famosa como a de Laura. Dedicava-se integralmente ao trabalho para poder esquecer sua amiga.
Até que um dia recebe uma ligação do Brasil de sua amiga Bia falando que esta com muita saudade e que gostaria de passar as férias na Itália. Carol então percebe a bobagem que tinha feito e diz a amiga que venha passar suas férias ali.
Os dias passam e chega o momento da chegada de sua amiga Bia.
Carol vai cedo para o aeroporto.
O avião pousa e Carol olha de longe aquela linda mulher que se dirige ao seu encontro.
Abraçam-se e sentem que hoje será um novo dia.
Carol leva sua amiga para seu apartamento e ficam conversando noite adentro.
Laura não aparece naquele dia e Bia nota a falta, mas não fala nada para sua querida amiga.
Os dias passam e as duas passeiam pelos museus, parques da cidade e vão a um café.
Chegando lá notam que Laura está acompanhada de outra mulher conversando carinhosamente e não percebem que elas estão ali.
Bia repara na decepção de sua amiga e diz:
-Vamos para outro lugar querida. Não tens que estar assistindo isso.
Saem então a caminhar e Carol chora copiosamente, Bia abraça a miga para dar conforto a ela.
E percebem que o carinho é maior do que elas imaginavam.
À noite Laura chega em casa feliz da vida e Carol pede para falar com ela.
-Laura quero que você seja sincera. Diga-me esta apaixonada por alguém?
-Ah!Como!
-Abra o jogo, vou sofrer, mas me fala.
-Certo, estou apaixonada por Sônia a médica de minha Clinica. Eu estava esperando para te contar.Mas se queres saber aconteceu logo após eu ter chegado do Brasil.Não queria te falar assim.Já que sabes então vou pegar minhas coisas e vou embora.
Laura pega seus pertences e se despede de sua amiga e vai para a casa de Sonia.
Aqui termina um episódio dessa estória de amor.
Laura fica arrasada com a situação e Bia conforta sua amiga.
Ficam abraçadas e adormecem no sofá.
No amanhecer Carol acorda e vê o café da manhã que Bia fez para elas tomarem. No centro da mesa flores vermelhas e uma musica suave toca no fundo.Então Carol dá-se conta do que tinha deixado de lado sua querida amiga Bia que a amava profundamente.
Bia convida Carol para voltar para o Brasil e colocarem uma Clinica juntas já que são formadas na área da Estética.
Resolve partir com sua amiga, mas precisa resolver algumas situações no emprego e o aluguel do apartamento.
Daquele momento em diante a relação das duas toma um novo rumo para viverem felizes.
Agora Carol feliz com sua amiga passa a sorrir e ver o belo da vida junto com ela.
No ritual do amor nada é impossível, basta querer e entregar-se firmemente num delírio de amor.
Assim elas voltaram para o Brasil e montaram uma Clinica e viveram felizes.

VERA LUCIA MARTINS SALBEGO – A professora e poeta gaucha Vera Salbego é formada em Letras pela PUC e pós-graduada em Psicopedagogia pelas Faculdade de Amparo – SP. PE autora de vários livros e tem participações em diversas antologias nacionais e internacionais, participando do Clube de Poetas Uruguaianenses, da Associação Gaúcha de Escritores e Membro Efetivo da Academia e Sala de Poetas e Escritores Virtuais, Poetas Del Mundo, Revista Paralelo 30 e tem diversos trabalhos publicados no Recanto das Letras.Em dezembro de 2006 foi agraciada em Porto Alegre com o Diploma Destaque Cultural pelo Jornal Revolução Cultural do Escritor Benedito Saldanha. Também edita o blog Vera Salbego.

VEJA MAIS:
GUIA DE POESIA
DIA MUNDIAL DA TERRA
CIDADANIA & MEIO AMBIENTE: UMA PALESTRA
CANTARAU

terça-feira, abril 21, 2009

DECAMERON DE BOCCACCIO



Imagem: poster do filme “Decameron” de Pier Paolo Pasolini.

A QUARTA NOVELA DE PAMPINÉIA – PRIMEIRA JORNADA DO DECAMERÃO DE BOCCACCIO

Um monge, que caira em pecado merecedor de punição muito severa, escapa dessa pena repreeendendo seu abade, uma culpa semelhante.

(...) Em Lunigiana, povoado não muito distante deste, existiu um mosteiro que fora, em outros tempos, mais rico, tanto em santidade quanto em monge, do que o é hoje. Havua neste mosteiro, entre outros, um monge ainda jovem, cujo vigor nem a aspereza do clima, nem os jejuns, nem as vigilias conseguiam abater. Certa vez, por volta do meio dia, quando estavam todos os demais monges dormindo a sesta, o jovem monge, por um simples acaso, saiu a passear, sozinho, pelas cercanias de sua igreja. O tempo estava localizado em local muito solitário.

Aconteceu que o monge viu uma jovem lindissima, filha, talvez, de algum dos lavradores da região. A jovem estava apanhando algumas ervas pelos campos. Assim que o monge a viu sentiu-se logo acometido pela concupiscência carnal. Por esta razão, acercou-se mais da jovem. Travou conversa com ela. E tanto saltou de uma palavvra a outra, que terminou por firmar um acordo com ela. Por esse acordo firmado, levou-a à sua cela, sem que ninguém o percebesse. Instigado por um desejo excessivo, brincou com ela mas de um modo, porem, menos cauteloso do que seria conveniente.

Sucedeu que o abade do mosteiro, onde dormira, e passando sem fazer ruido, em frente à sala do tal monge, escutou a barulheira que ele e a moça faziam, juntos lá dentro.
(...) Apesar de ocupado com a jovem, e ainda que disso gozasse enorme prazer, o monge não deixou de desconfiar de algo; a certa altura, tivera a impressão de ouvir um arrastar de pés, pela ala dos quatos de dormir. (...) Conhecendo o monge que, por esta razão, seria punido com grave castyigo, mostrou-se profundamente aborrecido. (...) Depois, fingindo já ter ficado o suficiente em companhia da jovem, disse-lhe:
- Quero achar uma maneira de você sair daqui de dentro sem que a vejam; assim sendo, fique aqui mesmo, calmamente, até que eu regresse.

Deixou a cela. Trancou-lhe a porta com a chave. E encaminhou-se diretamente para a cela do abade. Dando-lhe a chave, conforme a tradição a que todo monge obedecia, quando se ausentava do mosteiro, disse, com expressão tranquila e amiga:
- Senho abade, não pude, esta manhã, ordenar que trouxessem ao mosteiro toda a lenha que pude arranjar; por esta razão, com sua permissão, desejo ir ao bosque, para mandar que a tragam.

O abade, desejando informa-se por completo com relação à falta praticada pelo monge, ficou satisfeito com o seu modo de agir. Contente, recebeu a chave, e deu ao monge permissão para ir ao bosque.

(...) Bastou o monge retirar-se, e o abade procurou resolver o que seria mais certo fazer (...) Cogitando, entretanto, que a jovem podia muito bem ser esposa ou filha de algum homem que ele não gostaria de fazer passar por essa vergonham, decidiu que o melhor seria tratar, primeiramente, de saber quem era aquela moça, para depois resolvetr o que faria. Silenciosamente, dirigiu-se para a cela do monge; abriu-lhe a pota, entrou/ e outra vez fechou-a por dentro, naturalmente. Vendo entrar o abade, a moça ficou desconcertada. Cheia de vergonha e de medo, pôs-se a chorar. O senhor abade olhou-a por muito tempo; vendo=a tão bela e sensual, sentiu inesperadamente, aidna que um tanto idoso, os apelos da carne. Eram apeklos não menos ardentes do que aqueles que sentira o jovem monge. E a si mesmo começou a dizer:

- Enfim, que razão há para que eu deixe de desfrutar um prazer, quando posso desfrutá-lo, se, por outro lado, os aborrecimentos e os tédios estão sempre preparados para que eu os prove, queira ou não? Ai está uma bela moça; está nesta cela, se que nenhuma pessoa, no mundo, saiba disso. Se posso fazer com que me proporcione os prazeres pelos quais anseio, não existe nenhuma razão para que eu não a induza. Quem é que virá a saber disto? Ninguem, nunca o saberá! Pecado oculto é pecado meio perdoado. Um acaso destes quiçá jamais venha a se verificar de novo. Julgo ser conduta acertada colher o bem que Deus Nosso Senhor nos envia.

Assim refletindo, e tendo modificado inteiramente o proposito pelo qual fora até ali, acercou-se mais da moça. Com voz melíflua, pôs-se a confortá-la e a pedir, com instancia, que não chorasse. Palavra puxa palabvra, até que ele chegou ao ponto de poder evidenciar à moça o seu desejo. A jovem, que não era construida de ferro nem de diamente, atendeu, muito comoda e amavelmente aos prazeres do abade. O padre abraçou-a; beijou-a muitas vezes, seguidamente; atirou-se com ela na cama do monge. (...) o abade não se pôs sobre o peito da moça, antes colocou-a sobre o seu próprio peito. E durante muito tempo, entreteve-se com ela.

O monge, que havia fingido ir ao bosque, mas que, na verdade, esconde4ra-se na ala dos dormitórios, viu quando o abade entre em sua cela.

(...) Quando pareceu ao abade que já se demorara o bastante em companhia da jovem, deixou-a trancada na cela, e retornou ao seu quatro. Passado algum tempo, ouvindo que o monge chegava, e pensando que ele regressasse do bosque, decidiu censirá-lo e mandar que o prendessem no cárcere. (...) O monge, sem nenhuma hesitação, retrucou:
- Senhor abade, não estou, ainda, há pouco tempo bastante na Ordem de São bento para conhecer todas as singularidades de sua disciplina. O senhor não me mostrara ainda que os monges precisam fazer-se mortificar pelas mulheres, assim como devem faze-lo com jejuns e vigilias; agora, contudo, que o senhor acaba de mo demonstrar, prometo-lhe, se me conceder o perdão por esta vez, que nunca mais pecarei por esta forma; ao contrário, procederei sempre como vi o senhor fazer.

O abade, como homem astuto que era, reconheceu logo que o monge não só conseguira saber a seu respeito muiti além do que o suposto, mas ainda ver quanto ele fizera. Por esta ra~zoa, o abade sentiu remorsos pela sua propria culpa; e ficou vexado de aplicar ao monge o castigo que ele, tanto quanto o seu subordinado, merecera. Deu-lhe o perdão, mas impos-lhe silencio, sobre quanto vira. Depois, levaram ambos a moça para fora do mosteiro; e, depois, como é facil presumir, inumeras vezes a fizeram retornar ali.

BOCCACCIO – O Decamerão, numa tradução de Torrieri Guimarães, foi escrito em 1350 pelo escritor italiano que nasceu em Paris, Giovani Boccaccio (1313-1375), uma obra em prosa que relata em dez histórias curtas, contadas por sete moças e três rapazes que se refugiam no campo para escapar da peste negra, os conflitos entre os valores cristãos e o espírito libertino da época, questões ligada à transição para o Renascimento. O “Decameron” é composto por cem histórias que abrangem as mais peculiares paixões e comportamentos humanos, e mantêm em viva presença, os clamores da carne, a infidelidade e as trapaças sexuais A obra tem a propriedade de revelar em cada conto que o proibido e o pecaminoso vigiados pelas autoridades no final da Idade Média, concretizavam-se em práticas habituais no dia-a-dia das pessoas comuns, do clero e da nobreza. Na obra, conforme dito anteriormente, há dez personagens principais que, para fugir da peste, refugiaram-se em um castelo, onde nada havia a fazer. Teriam que passar ali muito tempo, até que o ambiente externo voltasse à salubridade. Para ocupar-se, cada um dos personagens contou uma história em cada um dos dez dias. Essa obra, apesar der ter sido escrita há mais de seiscentos anos, ainda pode ser lida como enorme prazer. Por isso, tornou-se um clássico da prosa ocidental e um dos maiores livros eróticos de todos os tempos.

FONTE:
BOCCACCIO, Giovani. Decamerão. São Paulo: Abril, 1979.

VEJA MAIS:
GUIA DE POESIA
CIDADANIA & MEIO AMBIENTE: UMA PALESTRA
CANTARAU

segunda-feira, abril 20, 2009

JOSÉ SARAMAGO



Imagem: Torso of Nude Woman Before a Mirror, detail, 1916, do pintor francês Pierre Bonnard (1867-1947]

O EVANGELHO DE SARAMAGO

“(...) Em verdade vos digo, não há limites para a malícia das mulheres, sobretudo as mais inocentes”.

“(...) entre as pernas de Maria, que assim têm de estar abertas as pernas das mulheres para o que entra e para o que sai”.

“(...) Maria parou ao lado da cama, olhou-o com uma expressão que era, ao mesmo tempo, ardente e suave, e disse, és belo, mas para seres perfeito, tens de abrir os olhos, hesitando Jesus abriu-os, imediatamente os fechou, deslumbrado, tornou a abri-los e nesse instante soube o que em verdade queriam dizer aquelas palavras do rei Salomão, as curvas dos teus quadris são como jóias, o teu umbigo é uma taça arredondada, cheia de vinho perfumado, o teu ventre é um monte de trigo cercado de lírios, os teus dois seios são como dois filhinhos gêmeos de uma gazela, mas soube-o ainda melhor, e definitivamente, quando Maria se deitou ao lado dele, e, tomando-lhe as mãos, puxando-as para si, as fez passar, lentamente, por todo o seu corpo, os cabelos e o rosto, o pescoço, os ombros, os seios, que docemente comprimiu, o ventre, o umbigo, o pubis, onde se demorou, a enredar e a desenredar os dedos, o redondo das coxas macias, e, enquanto isto fazia, ia dizendo em voz baixa, quase num sussurro, aprende, aprende o meu corpo. Jesus olhava as suas próprias mãos, que Maria segurava, e desejava tê-las soltas para que pudessem ir buscar, livres, cada uma daquelas partes, mas ela continuava uma vez mais, outra ainda, e dizia, aprende o meu corpo, aprende o meu corpo. Jesus respirava precipitadamente, mas houve um momento em que pareceu sufocar, e isso foi quando as mãos dela, a esquerda colocada sobre a testa, a direita sobre os tornozelos, principiaram uma lenta caricia, na direção uma da outra, ambas atraídas ao mesmo ponto central, onde, quando chegadas, não se detiveram mais do que um instante, para regressarem com a mesma lentidão ao ponto de partida, donde recomeçavam o movimento. Não aprendeste nada, vai-te, dissera pastor, e quiçá quisesse dizer que ele não aprendera a defender a vida. Agora Maria de Magdala ensinara-lhe, aprende o meu corpo, e repetia, mas doutra maneira, mudando-lhe uma palavra, aprende o teu corpo, e ele aí o tinha, o seu corpo, tenso, duro, ereto, e sobre ele estava, nua e magnífica, Maria de Magdala, que diz, calma, não te preocupes, não te movas, deixa que eu trate de ti, então sentiu que uma parte do seu corpo, essa, se unira ao corpo dela, que um anel de fogo o rodeava, indo e vindo, que um estremecimento o sacudia por dentro, como um peixe agitando-se, e que de súbito se escapava gritando, impossível, não pode ser, os peixes não gritam, ele, sim, era ele quem gritava, ao mesmo tempo que Maria, gemendo, deixava descair o seu corpo sobre o dele, indo beber-lhe da boca o grito, num sôfrego e ansioso beijo que desencadeou no corpo de Jesus um segundo e interminável frêmito”.

“(...) em todo o caso o mais provável foi que nenhum daqueles homens, moradores de Magdala ou passantes informados, tivesse querido arriscar-se a ouvir a praga que os condenaria à impotência, pois é geral convicção que as prostitutas, sobretudo as de alto coturno, diplomadas ou de largo currículo, sabendo tudo sobre as artes de alegrar o sexo de um homem, também são muito competentes para reduzi-lo a uma soturnidade irremediável, cabisbaixo, sem animo nem apetites. Gozaram, pois, Maria e Jesus de tranqüilidade durante aqueles oito dias, durante as quais as lições dadas e recebidas acabaram por passar a um discurso só, compostos de gestos, descobertas, surpresar, murmúrios, invenções...”

“(...) Sou como a tua boca e os teus ouvidos, respondeu Maria de Magdala, o que disseres estarás a dizê-lo a ti mesmo, eu apenas sou a que está em ti”.

JOSÉ SARAMAGO – O escritor e poeta português José Saramago, filho e neto de camponeses nasceu na aldeia de Azinhaga na província do Ribatejo, no dia 16 de novembro de 1922, apesar de constar no registro oficial o dia 18. Mas esse não foi o único fato curioso dos primeiro anos de Saramago. Quando foi registrá-lo, seu pai pretendia que seu filho se chamasse apenas José da Silva, mas como seu apelido na aldeia era Saramago, a pessoa encarregada de registra-lo deu ao filho o apelido do pai. Por isso José da Silva veio a chamar-se Saramago. A "brincadeira" foi descoberta quando a matrícula de José Saramago da Silva foi rejeitada porque este não tinha o mesmo nome do pai. O pai de Saramago teve, então, de mudar de nome (acrescentando Saramago) para que seu filho pudesse estudar. Aos dois anos Saramago acompanhou a família à Lisboa, mas nunca distanciou-se definitivamente da aldeia de Azinhaga. Aos doze anos, por problemas econômicos, Saramago teve que transferir-se para uma escola técnica. Se aos onze anos Saramago ganhou seu primeiro livro de sua mão (O Mistério do Moinho), aos 18 era um frequentador assíduo, noturno, da Biblioteca do Palácio das Galveias, onde, sem nenhuma instrução, lê tudo que pode. Até os 25 anos, quando publicou Terra do Pecado, seu primeiro romance, Saramago trabalhou como serralheiro, desenhador, funcionário da saúde e da previdência social. Terra do Pecado tinha por nome oficial, dado por Saramago, A Viúva, mas como editor o achou pouco comercial, decidiu mudá-lo. Ainda em 1949, Saramago escreveu Clarabóia, que foi recusado pela editora (esse romance ainda permanece inédito até hoje). Saramago só passa a se dedicar exclusivamente à literatura em 59, quando assume o lugar de Nataniel Costa como editor literário na Editorial Estúdio Cor. Daí até seu segundo livro publicado, Os Poemas Possíveis, são sete anos. Esse tempo todo de silêncio literário (de 1947 até 1966) Saramago atribui a não ter o que dizer. Seu próximo livro, Provavelmente Alegria, saí em 1970, dois anos antes de ingressar no jornalismo. E dessa passagem pelos jornais A Capital e Jornal de Fundão que nasce A Bagagem do Viajante, em 1973. A mudança de Saramago começa a acontecer em 1975, quando é nomeado diretor-adjunto do Diário de Notícias. Neste mesmo ano é demitido do diário e toma a decisão que mudaria o curso de sua escrita: decidiu somente escrever. Nesse tempo, sua única fonte de renda fixa eram as traduções. No final do ano publica O Ano de 1993, até hoje seu último livro de poesias. A partir dos 55 anos a produção literária de Saramago cresce assustadoramente, se comparada com o que ele escreveu até então. Mas é em 1980 que Saramago dá a maior guinada da sua vida literária, com a publicação de Levantado do Chão. Muitos críticos dizem que esse livro é o início do estilo saramaguiano (escrita barroca, longos parágrafos e uma forma diferente de construir os diálogos: Saramago elimina os travessões, que ele diz não haverem num diálogo comum, o que dá uma maior dinámica ao texto). Em 1991, Saramago lançou aquela que seria a sua mais polêmica obra: O Evangelho Segundo Jesus Cristo . Em 92, o Evangelho foi indicado para concorrer ao Prêmio Literário Europeu, mas o governos português, mais precisamente Souza Lara, vetou a sua candidatura, dizendo que essa obra "não representa Portugal" e que desunia o povo português muito mais do que o unia. Magoado com a censura da sua obra, Saramago resolveu deixar Portugal e se mudar para Lanzarote , nas ilhas Canárias, em 1993. Todo o processo criativo de Saramago foi mundialmente reconhecido quando da entrega do Prêmio Nobel de Literatura, ganho por ele em 1998.

FONTE:
SARAMAGO, José. O evangelho segundo Jesus Cristo. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.

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CIDADANIA & MEIO AMBIENTE: UMA PALESTRA
CANTARAU

sexta-feira, abril 17, 2009

VERS&PROSA PARA A MENINA AZUL



Imagem/foto: Derinha Rocha.

SHALESPEREANA

V

(A mútua dívida do amor)

Luiz Alberto Machado

Toda sexta-feira, meio dia em ponto, não dou mais desconto nem prazo a correr.

É dar ou fazer, não tem mais saída, obrigação já vencida só pra liquidar.

Pode até amortizar, importa adimplir, seu compromisso cumprir e sem arrazoado.

Pague logo o acertado sem cheque ou promissória porque essa cominatória só vale o que está riscado.

Não vá pular de lado, não adianta sustar, nem mesmo embargar, isso pode então custar muito desentendimento.

Pois a cada pagamento, vem o seu aditamento com a amortização.

Isso senão parto para arrematar e nem adianta arrestar ou forçar protelação.

Não brinque não, pague logo o que me deve, com celeridade breve resolvendo essa caranha.

Pois você ainda se banha diante das circunstâncias sem usar das implicâncias e comigo concordar.

Pode acordar de ser a Juliette Binoche toda só no rosa-choque, coisa linda a seduzir.

Ou pode assim, chegar Letícia Sabatella me chamando de banguela, querendo me provocar.

Vou avisar, não dou trégua nem emborco, vire-se Denise Stoklos ou Lucinda Elisa cover.

Ou faça pose, meta bronca sorrateira, pode plantar bananeira que não vou voltar atrás.

Seja sagaz, uma moça inteligente, seja bem obediente que não haverá nenhum conflito.

Faça bonito, chegue junto bem cordata sem armar qualquer bravata pra gerar mais prejuízo.

Então sugiro uma conversa amistosa, toda fina e toda prosa não correndo o menor risco.

Como petisco e armada a cortesia negociar assim podia de uma forma confortável, já pra lá de amigável quando ambos concordantes.

E adiante com fina habilidade, cordial amabilidade, entrar negociação com a maior demonstração e toda transparência, na maior das diligências tudo no maior conforme.

E se informe, caso seja essa intenção, porque do contrário então, a coisa se empena.

Não terei a menor pena, muito menos piedade.

E sei que na qualidade de credor condescendente, você vai ficar contente se a gente até brigar.

Vamos emendar e não seja tão velhaca, então vem e desempaca, pagando sua dívida.

Não fique lívida na maior da saia-justa, nem vá beber cicuta nem dê um carreirão.

Pode até ir pro Japão que estarei no seu encalço.

Você não sai do meu laço já está toda empenhada, com a calcinha afiançada, a blusinha e saia rendada, tudo já hipotecado.

Nem olhe de lado, fique logo bem nuínha e também meio arretada, se achegue logo tarada pronta pra fazer litígio.

Bote prestígio e venha nua pra emboscada, pronta pra minha cilada e pro maior esfregamento, que tô assim que nem jumento pronto para vadiar.

Quero mesmo me esbaldar por todo seu comprimento e essa sua arquitetura, pronto pra maior loucura, ferve quente o xambregar.

Isso pra cá, me agarrando com firmeza toda sua redondeza, tudo em cima, cabo a rabo.

Depois de quatro vai arcar com a despesa na maior das safadezas na demanda do tesão.

Você vai mexer pirão p´reu deixar limpo seu prato na oblação dos seios fartos até piar cancão.

Vou ajeitar meu quinhão no seu ventre apetitoso, nas ancas o guidão jeitoso, nas costas o meu repasto.

E quando farto da garanhagem e euforia, vou aprumar a minha guia pra ser agasalhado.

E sentir um bem guardado com toda litania pra você fazer no dia todo seu maior pecado.

Depois de bem dado, devendo ainda está, vou querer me aproveitar cobrando juros e mora.

E aí já sem demora exijo a quitação da primeira prestação acertada na penhora.

E isso agora que eu quero me empanzinar.

Juro que não vou ficar com fastio ou de biqueiro, vou gozar todo banzeiro até o galo cantar.

É bom pagar todo dengo com carinho, toda manha com jeitinho ou coisa parecida.
E isso pra toda vida, até perder de vista coisa de uma correntista num prazo esticado.

Está fadado seu dever reincidente, até mesmo sucumbente, coisa líquida e certa.

E seja esperta, porque esta pendência não terá mais decadência, muito menos desistência, coisa do maior valor.

E como autor, pego toga de excelência, visto toda competência e viro douto julgador.

Do que ficou, dou-lhe a mais formal ciência do teor dessa sentença, julgamento que valeu: você me deve uma conta.

E eu também devo a você.

No amor não se desconta, principalmente quando desponta coisa mútua que se deu.

Já que o seu é meu e o meu é seu, queira tudo o que é meu e mais quiser porque eu quero tudo seu porque tudo de seu é meu.

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VERS&PROSA PARA A MENINA AZUL

terça-feira, abril 14, 2009

OCTAVIO PAZ



Imagem: Nude with Calla Lillies, 1944, do pintor do Realismo social e muralista mexicano Diego Rivera (1886-1957).

OS FILHOS DO BARRO DE OCTAVIO PAZ

“A sensibilidade dos pré-românticos não tardará em se transformar na paixão dos românticos. A primeira é um acordo com o mundo natural, a segunda é a transgressão da ordem social. Ambas são natureza humanizada: corpo. Ainda que as paixões corporais ocupem um lugar central na grande literatura libertina do século XVIII, somente nos pré-românticos e nos românticos o corpo começa a falar. E a linguagem que fala é a linguagem dos sonhos, dos símbolos e das metáforas, numa estranha aliança do sagrado com o profano e do sublime com o obsceno. Essa linguagem é a da poesia, não a da razão. (...) Na obra mais livre e mais ousada desse período, a do marquês de Sade, o corpo não fala, embora tenha sido o corpo e suas singularidades e aberrações o único tema desse autor: quem fala através desses corpos ensangüentados é a filosofia. Sade não é um autor passional: seus delírios são racionais e sua verdadeira paixão é a crítica. Exalta-se, não diante das posições dos corpos, mas diante do rigor e do brilho das demonstrações. O erotismo de outros filósofos libertinos do século XVIII não tem o exagero de Sade, porém não é menos frio e racional: não é uma paixão, mas uma filosofia”.

“(...) Para uns a liberdade erótica é sinônimo de imaginação e paixão, para outros significa uma solução racional dos problemas das relações físicas entre os sexos. Bataille acreditava que a transgressão era condição e também essência do erotismo; a nova moral sexual acredita que se forem suprimidas ou atenuadas as proibições, a transgressão erótica se atenuará ou desaparecerá. Blake disse: “Nós dois lemos a Biblia noite e dia, mas tu lês negro onde eu lei branco”

“O sonho de uma comunidade igualitária e livre, herança comum de Rousseau, reaparce entre os românticos alemães, aliado como em Holderlin ao amor, só que agora de um modo mais violento e denunciador. Todos estes poetas vêem o amor como transgressão social e exaltam a mulher não apenas como objeto, mas como sujeito erótico”.

“A figura de Wiliam Blake condensa as contradições da primeira geração romântica. Condensa-se e as faz rebentar uma explosão que vai além do romantismo. Foi um verdadeiro romântico? O custo da natureza, que é um dos rasgos da poesia romântica, não aparece em sua obra. Acreditava que o mundo da imaginação é o mundo da eternidade, enquanto o mundo da geração é finito e temporal. Esta idéia aproxima-o dos gnósticos e dos iluminados, mas seu amor ao corpo, sua exaltação do desejo erótico e do prazer – aquele que deseja e não satisfaz seu desejo engendra pestilência – o colocam contra a tradição neoplatonica. Embora se chamasse adorador de Cristo, foi cristão? Seu Cristo não é o Cristo dos cristãos: é um titã nu, que se banha no mar radioso da energia erótica. Um demiurgo, para quem imaginar e agir, desejar e satisfazer o desejo são uma única e mesma coisa. Seu Cristo lembra mais o Satã de The marriagé of Heaven na Hell (1793); seu corpo é como uma gigantesca nuvem iluminada por relâmpagos incessantes: a escritura chamejante dos provérbios do Inferno”.

“A influência dos gnósticos, dos cabalistas, dos alquimistas e de outras tendências marginais dos séculos XVII e XVIII foi muito profunda, não entre os românticos alemães, como no próprio Goethe e seu circulo. A mesma coisa deve-se dizer dos românticos ingleses e, claro, dos franceses. De seu lado, a tradução ocultista dos séculos XVII e XVIII entronca-se com vários movimentos da critica social e revolucionária, simultaneamente libertária e libertina. A crença na analogia universal está tingida de erotismo: os corpos e as almas unem-se e separam-se, regidos pelas mesmas leis de atração e repulsão que governam as conjunções e disjunções dos astros e das substancias materiais. Um erotismo astrológico e um erotismo alquímico; igualmente um erotismo subversivo: a atração erótica rompe as leis sociais e une os corpos sem distinção de classes e hierarquias. A astrologia erótica oferece um modelo de ordem social fundamentado na harmonia cósmica e oposto à ordem dos privilégios, da força e da autoridade; a alquimia erótica – união dos princípios contrários, o masculino e o feminino, e sua transformação em outro corpo – é uma metáfora das trocas, separações, uniões e conversões das substancias sociais (as classes), durante uma revolução. Correspondências verbais: a revolução é um crisol no qual se produz a amalgama dos diferentes membros do corpo social e sua transubstanciação em outro corpo. O erotismo do século XVIII foi um erotismo revolucionário de raízes ocultistas, tal como pode ver nos romances libertinos de Restif de La Bretonne. Do misticismo erótico de um Restif de La Bretonne à concepção de uma sociedade movida pelo sol da atração apaixonada, não havia senão um passo. Esse passo chama-se Charles Fourier. A figura de Fourier é central tanto na história da poesia francesa como na do movimento revolucionário. Não é menos atual que Marx (e suspeito que começa a sê-lo mais). Fourier pensa, como Marx, que a sociedade é regida pela força, a coerção e a mentira, mas diferentemente de Marx, acredita ser a atração apaixonada, o desejo, o que une os homens. A palavra desejo não figura no vocabulário de Marx. Uma omissão que equivale a uma mutilação do homem. Para Fourier, mudar a sociedade significa liberá-la dos obstáculos que impedem a operação das leis da atração apaixonada. Esse leis são leis astronômicas, psicológicas e matemáticas, mas são também leis literárias, poéticas”.

“(...) Fourier sustenta que o desejo não é necessariamente mortífero, como afirma Sade, nem a sociedade é repressiva por natureza, como pensa Freud. Afirmar a bondade do prazer é escandaloso: Sade e Freud confirmam de certo modo – o modo negativo – a visão pessimista do cristianismo judaico (...) Baudelaire reprova Fourier por não ter escrito uma poética, isto é, reprova-o por não ser Baudelaire. Para Fourier, o sistema do universo é a chave do sistema social; para Baudelaire, o sistema do universo é o modelo da criação poética”.

“Novalis havia dito: tocar o corpo de uma mulher é tocar o céu. E Fourier: as paixões são matemáticas animadas”.

“O espanhol Cernuda vê no prazer não só uma explosão corporal como uma critica moral e política da sociedade cristã e burguesa: abaixo estátuas anônimas, preceitos de névoa, uma chispa daqueles prazeres brilha na hora vingativa, seu fulgor por destruir vosso mundo”.

“(...) O capitalismo dessagrou o corpo: deixou de ser o campo de batalha entre os anhos e os demônios e transformou-se em um instrumento de trabalho. O corpo foi uma força de produção. A concepção do corpo como força de trabalho conduziu imediatamente à humilhação do corpo como fonte de prazer. O ascetismo mudou de signo: não foi um método para ganhar o céu, mas uma técnica para aumentar a produtividade. O prazer é um desperdício, a sensualidade, uma perturbação. A condenação do prazer abrangeu também a imaginação, pois o corpo não é apenas um manancial de sensações, mas também de imagens. As desordens da imaginação não são menos perigosas para a produção e seu rendimento perfeito que os abalos físicos do prazer sensual. Em nome do futuro, completou-se a censura do corpo com a mutilação dos poderes poéticos do homem. Assim a rebelião do corpo é também a da imaginação. Ambas negam o tempo linear: seus valores são os do presente. O corpo e a imaginação ignoram o futuro: as sensações são a abolição do tempo no instantâneo, as imagens do desejo dissolvem passado e futuro em um presente sem datas. É o retorno ao principio do principio, à sensibilidade e à paixão dos românticos. A ressurreição do corpo talvez seja um aviso de que o homem recuperará em algum tempo a sabedoria perdida. Pois o corpo não nega somente o futuro: é um caminho para o presente, para esse agora onde a vida e a morte são as duas metades de uma mesma esfera”.

OCTÁVIO PAZ – Poeta, escritor e diplomata mexicano, Octavio Paz (1914-1998), foi Prêmio Nobel de Literatura de 1990, foi integrante do Movimento Surrealista, sendo autor de mais de 20 livros de poesia e incontáveis de ensaios de literatura, arte, cultura e política. Os textos aqui publicados foram retirados do seu livro “Os filhos do Barro”, traduzido pela poeta Olga Savary.

FONTE:
PAZ, Octavio. Os filhos do Barro. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984.

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GUIA DE POESIA

segunda-feira, abril 13, 2009

RAYMUNDO ALVES DE SOUZA



Imagem: Catarina, de Jorge Pedra.

A POESIA DE RAYMUNDO ALVES DE SOUZA

PAIXÃO

És tão linda que encanta
Tens um olhar tão brilhante
Do rouxinol que canta
Lá no fim do horizonte.
É linda tua faceirice
No belo jeito de andar
Que provoca meiguice
Dá vontade de te amar.
O teu sorriso é um poema
Que o vate vive a cantar
Tens beleza tão serena
Que minh´alma fica a sonhar
A gente pensa que está
Gozando o teu carinho
E minh´alma fica a pensar
No peito, o teu ninho.

PINGO DE AMOR

Pinga um pouco de amor
Na taça do desejo,
Um pouquinho, minha flor,
Basta... só quero um beijo.
Vê eu estou te pedindo
Cansado de esperar,
É melhor pedir sorrindo
Do que zangado beijar.
De nada vale negar
Eu fico enfeitiçando
Andando pra lá e pra cá
Pra findar te beijando.
Noto no teu sorriso
Dois pecados se escondendo
Se não é um paraíso
É o amor que está fervendo.

GLORIA DE AMAR

Vem, vem, vem logo pra cá
Passar a noite sonhando
No quarto escuro, és luar,
Beijando e nos abraçando.
Aurora já clareando
Tu, no meu colo, eu no teu,
Longe o sol despontando
O medo de amar, já morreu.
Nos já perdemos o medo
Meu bem vamos passear
Nosso amor não é segredo
Amanhã nós vamos casar.
Vou tirar uma licença
Pra gozarmos lua-de-mel
Nela morreu a inocência
Só resta, amor, gloria e fé.

ENCICLOPEDIA DO AMOR

I

O amor de uns olhos
Que avistou os abrolhos
Quando olhava pro mar.
O amor de uns lábios
Que ainda sente os ressábios
Do beijo do amor
O amor da boca
Da pequena que é louca
Pra você ir beijá-la
O amor de um pescoço
Que nos lembra o esboço
Do corpo de Vênus

II

O amor de uns ombros
Que se vê com assombro
Enfeitando o colar.
O amor de um colo
Que traiu Apolo
Pra vir nele sonhar
O amor de uns seios
Que provoca anseios
Da gente beijar.
O amor de umas curvas
Que mente nos turva
E nos manda afagar.

III

O amor paraíso
O amor de um sorriso
Que nos faz delirar.
O amor esperança,
O amor que nos cansa
De tanto esperar.
O amor majestade
O amor castidade
O amor da moral.
O amor dos ribeiros
Correndo ligeiros
A procura do mar.

IV

O amor sem vaidade
Amor piedade
Que nos manda rezar.
O amor reação
O amor da ilusão
Do que já se sonhou.
O amor que fenece
O amor de uma prece
Ao pé do altar.
O amor dos passarinhos
O amor dos seus ninhos,
Seu berço e seu lar.

CURIOSIDADE

No colo da minha amada
Eu vi uma coisa mexendo
Era uma pulga danada
Mordendo os lindos seios.
Pedi pra pulga tirar
Ela ficou sorrindo
Não deixe ninguém me olhar,
Venha... a pulga está fugindo.
Nada mais lá encontrei
Mordendo o seu regaço
Apaixonado eu beijei
E suspirei nos seus braços.
Vi quando despertei
A minha flor suspirando
Novamente eu beijei
Ouvindo meu amor cantando.

PAIXÃO

Satisfazendo os anseios
Da paixão que me devora
Eu vou beijar-te, senhora.
Na curva destes teus seios.

DESEJO

Quem me dera fosse eu cego,
Pra seres tu minha guia,
Nunca mais dos olhos d´alma
A tua imagem saia.

GOSTO DE MEL

Nunca senti tanta fé
Nem uma ânsia tão louca
De sentir o gosto do mel
Do favo da tua boca.
Um dia, eu vou te agarrar
Um descuido aproveitando
Nos teus lábios vou ficar
A vida toda beijando.
Se me deres uma dentada
Eu também vou te morder
Fica a paixão empatada
Um beijo é quem vai vencer.
Não queres beijos e abraços:
Isto não te dar fervor?
Vamos perder um pedaço
Que tira o prazer do amor.

CONFISSÃO

Ao delegado do amor,
Meu delito confessei:
O crime do meu desejo,
Três sentenças ele ditou:
Dar mais de cinqüenta beijos
Todos com muito fervor!
Na mulher que sempre amei.
E não, fugir da prisão,
Se não, eu era enforcado.
Na corrente dos seus olhos,
Laço do seu coração,
E ali, ficar sempre amando,
Nas algemas do seu colo,
Grilhões da sua paixão
E nunca mais partir o laço
Da minha beça intenção
De viver no lindo regaço.
E de ser decapitado
Com a lâmina do seu olhar,
O punhal dos seus seios,
A navalha do seu sorriso,
O carrasco sendo os seus seios.
E ali ficar enterrado
Num eterno paraíso.

EU VOU ME CANDIDATAR,
VOU GORVERNAR TUA VIDA

Vou começando a falar
Com o som do teu sorriso,
Neste momento, preciso,
Eu vou me candidatar;
Vou no comício lutar,
Começar minha lida
Pra te vencer, oh querida
Escuta bem o que eu digo
Embora surja castigo
Vou governar tua vida.

EU VI UM COLO FORMOSO
QUE LHE ENFEITAVA O COLAR

Olhando malicioso
Lá num regato a brincar,
Convidando a versejar
Eu vi um colo formoso.
Qual será o venturoso
Beija-flor que vai beijar,
Fluir, sentir e sonhar
Nos seios, duplos assombros
Daqueles tão lindos ombros
Que lhe enfeitava o colar.

CANTIGA POPULAR

- Tive tias e sobrinhas
Mucamas e crias de casa,
Com todas eu fiquei vaza,
Todas foram fêmeas minhas.
Até as próprias vizinhas,
De mim tomaram barriga,
Ta você mesmo que diga,
Que foi meu alcoviteiro,
O seu pai foi meu meeiro
E sua mãe foi minha amiga.

COM MINHA ALMA ENLEIADA
DA ESSENCIA DO SEU PEITO

Numa noite enluarada
Olhando o belo luar
Fugiu pra eu não beijar
Com a ama enleiada
Mas, eu beijei minha amada
No seu amor fui eleito
Com o prazer satisfeito
Abracei só pra sentir
Aquele aroma subir
Da essência do seu peito.

LINDA, LINDA DE MORRER
PROVOCANDO DOCE ILUSÃO

Faz um amor renascer
Lindos lábios sorrindo
Sua bela voz se ouvindo
Linda, linda de morrer;
Obriga a gente a querer,
Na orquestra do coração
Do amor cantar a canção,
Das serenatas da vida,
Beijando a mulher querida
Provocando doce ilusão.

RAYMUNDO ALVES DE SOUZA – Nascido em Panelas, em 1884, viveu em Palmares onde morava sua avó e onde se formou artisticamente, destacando-se entre os poetas, escritores e artistas locais do passado. Foi aluno da mãe do poeta Ascenso Ferreira, foi pro seminário desistindo depois da ordenação, passando a trabalhar no barracão do Engenho Japaranduba, quando se torna mestre alfaite. Daí, colaborou com jornais e revistas pernambucanos e de outros estados. Tornou-se ator, casou-se, estreitou amizade com Ascenso Ferreira, casa-se de novo quando vai pro Recife, re-casou-se e vai se casando infinitamente, tornou-se vereador palmarense pelo PSD, fundando a Academia Palmarense de Letras. Em 1979, foi publicado o primeiro e único número do caderno cultural Nova Caiana, em Palmares, “Vida & Poesia de Raimundo Alves de Souza”, sob a coordenação editorial de Juhareiz Correya. Posteriormente seus poemas foram incluídos na antologia “Poetas dos Palmares”, edição de 1987. Em 1988 foi publicado pelas Edições Bagaço o livro “Celeiros d´alma – antologia poética”.

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GUIA DE POESIA

quinta-feira, abril 09, 2009

VERS&PROSA PARA MENINA AZUL



Imagem: foto/arte de Derinha Rocha.

SHALESPEREANA

IV

(A GUERRA DO AMOR)

Luiz Alberto Machado

Toda sexta-feira, meio dia em ponto, dá-se o confronto e eu estou nu front de nossa guerra armada.

Nua abastada na soberba do seu trono não sabe do pandemônio que vou armar por buruçú com manobras de Sun Tzu num Guevara ressuscitado, pelejando revoltado a revolução libertadora.

Ave canora tão linda e indiferente vai saber no de repente com quantos paus se faz canoa.

E não à toa no meu solfejo zapatista, meu propósito reformista no seu corpo que é Chiapas.

Numa bravata sem acordo de Genebra nem de quebra o de Bogotá, muito menos haverá quem que nos detenha nessa dança tão portenha.

E que venha o combinado de Lacandona, pois assim, minha madona, saquearei seu fausto na peleja porque toda riqueza traz um encoberto crime, tudo impune, tudo se exime na maior das sem-gracezas.

E com firmeza vou impor minhas vontades devassando a sua propriedade, o seu reino e barricadas, seus motins, suas brigadas, até deixá-la indefesa.

E assim seja, com meus mísseis, os meus beijos; e o meu desejo é a munição de peso que agirá sobre tudo o que é defeso, tudo além do bem e do mal.

Vou sublevar sua cabeça paraguaia quando suas mãos uruguaias acenderem o meu braseiro.

Sou brasileiro com rajadas de jeitinho, bombardeio com carinho e ternura incendiária pra na reforma agrária me apossar da sua mina, toda alma feminina, seu encanto e seu poder.

Nada a esconder, não haverá um só esconderijo que o meu membro todo rijo não venha reconhecer.

E por vencer com valor e com denodo, aceitarei ser seu todo poderoso, ser seu rei e seu oxossi, tomando a minha posse sobre tudo do vencido.

E pro seu castigo vai festejar minha vitória que por ser tão meritória, se renda aos caprichos meus e dê graças a deus no prazer da minha glória.

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VERS&PROSA PARA A MENINA AZUL

sexta-feira, abril 03, 2009

VERS&PROSA PARA A MENINA AZUL



Imagem: Foto/Arte de Derinha Rocha

SHAKESPEAREANA

III
(NOSSA FESTA)

Luiz Alberto Machado

Toda sexta-feira, meio-dia em ponto, eu bato meu ponto pro que der e vier.

Meio dia em ponto, toda sexta-feira eu chego já pronto e o que é o que é.

E ela vem de viés com toda surpresa, rompendo a represa de querer mais.

É tudo demais e ela só me fascina, jóia excepcional, uma real mina, bailarina de Degas.

Ou nua vestal, dançarina de fuá.

E eu sentimental com toda destreza arrasto essa presa, astuta indefesa do pito voar.

E para empenar tomo a pele e o pulso, a deixo em soluço a gemer de manhar.

A se espernear no corpo rendido, eu domino o seu urânio enriquecido pronto pra explodir e eu só pra acudir num bote certeiro, quando vou de matreiro adornar seus quadris.

E se faz bela atriz ensaiando sem medo a me ter entre os dedos, a me lamber num enredo de São Paulo a Paris.

O que eu sempre quis e me morde abusada, se entope e se engasga entornando o seu mel.

Eu adoço seu fel e vou de gandaia com minha azagaia no seu beleléu.

Já sou réu condenado a morrer um bocado no meio do céu.

Onde ela faz escarcéu, reluta e se esgana, ela goza sacana no maior pitéu.

Ao léu a valer, ela não satisfez.

E vem tudo de novo pra glória de um rei, ela sabe e eu não sei, o que importa é viver e venha tudo outra vez.

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VERS&PROSA PARA A MENINA AZUL
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TODO DIA É DIA DA MULHER