Arte: Meimei Corrêa
CRÔNICA DE AMOR POR ELA
Luiz Alberto Machado
Nada
merece mais a nossa gratidão que o ventre materno, seja ela simples dona de
casa alagoana ou uma resignada do mosteiro de Argenteuil.
Decerto
todos nós passamos pelo canal de parturição, nós, vivos ou mortos, já viajamos
nove meses na aeronave do ventre, dependentes da ternura materna até termos a
consciência do oxigênio e da vida.
Nada
seria interessante se não fosse o poder da concepção que elas carregam no
ventre, seja ela secretária executiva de Natal ou trabalhadora de Orange.
Nada
é mais admirável que a fecundação quando tudo se faz de prazer atravessando a
zona pelúcida para gerar filhos da vida, adubados pelo carinho e a ternura da
maternidade, seja de uma simples balconista de Terezina ou aquela de
Guaratinguetá de Di Cavalcanti.
Admirável
é a sua anatomia, o seu design belo de recipiente do amor e do prazer, seja ela
gueixa de Kioto, Aprés le l bain de Degas ou vendedoras de frutas da Martinica.
Ou mesmo a de Unamuno no banho, ou costureira do mercado de Abi Djan.
Que
seja amada como uma simples rendeira de Aracati, ou mestiça do Gabão; ou
tuaregue do Níger; ou ticoqueira da cana-de-açúcar.
Que
seja amiga mesmo como camponesa nordestina ou do milharal do Haiti. Ou mesmo
uma cachorrona sexy, maluca pauleira, fatal miss ou sedutora perversa.
Que
seja malandra, dócil ou abestada, ou quitandeiras do Recife, prostitutas de
Brasília ou a executante de alaúde de Caravaggio.
Sempre
serão belas mesmo que seja uma simples jovem turca, ou esquimó da Groenlândia
ou, mesmo, a Garota de Ipanema.
Sempre
serão exuberantes mesmo na simplicidade daquela das colinas de Chittagong em
Bangladesh ou aquela lavadeira de Portinari. Ou nativa birmanesa ou aquela
marabá de Rodolfo Amoedo. Ou mesmo a colhedora de chá do Ceilão ou uma linda
índia Kamayurá. Ou, ainda, Le bain au serail de Theodore Chasseriau.
Pode
ser uma humilde tecelã de seda em Bali ou operária de qualquer montadora de São
Bernardo do Campo. Ou a nômade Fars, ou humilde verdureira da feira de Caruaru.
Pode
ser uma dedicada vendedora de cosméticos de Aracaju ou Nu à contre jour de
Bonnard. Ou uma Diana de Lee Falk, ou a Danae de Rembrand.
Pode
ser uma teimosa da vida ou Fleurs de la prairie de Maillol ou humilde
enfermeira de um hospital de João Pessoa.
Pode
ser uma adolescente eterna sonhadora ou a estudante de Anita Malfati ou uma
nativa das ilhas Trobriand, ou a Vênus Anaduomene de Ingres ou As Artes de Van
Gogh.
Que
seja musa dos escritores, poetas e compositores ou mesmo uma perdida nas veredas
da vida, ou Vairumati de Gaugin, Vênus de Brozino ou a que carda lã no Nepal.
Seja
a Bovary de Balzac ou a dedicada submersa entre marido e filhos. Ou a Nu de
Modigliani ou uma passageira de Olinda; seja a mãe de Almada Negreiros, ou de
Gorki, ou Valentina de Guiido Crepax.
Seja
ela Velta, ou Lôra Burra, a Vênus de Urbino de Ticiano ou Léda Atomique de
Salvador Dali; ou femme de frisant de Toulouse-Lautrec; ou uma da cadeira de
David Lingare.
Mas
também que seja ela Safo, louca, aguerrida ou desgarrada. Que seja uma sumidade
intelectual ou muçulmana de Oman, mestiça de Cuenca, mulata do Rio de Janeiro
ou mesmo estabanada andrógina da noite na paulicéia desvairada.
Seja
mesmo o que for: a “Mulher” de Geraldinho Azevedo & Neila Tavares, ou mesmo
“Todas elas juntas num só ser” de Lenine & Carlos Rennó, ou tantas outras
grandes e anônimas mulheres deste planeta, aqui só gratidão. Obrigado por
existirem. Esta a minha homenagem, MULHER.