terça-feira, janeiro 08, 2008



Imagem: Love and Psyche, 1589 (Galleria Borghese, Rome, Italy) obra do pintor do maneirismo italiano Jocopo Zucchi (1540-1596).


AO REDOR DA PIRA ONDE QUEIMA O AMOR

I

O assédio de Succubus

Luiz Alberto Machado

A noite, a solidão e os devaneios. Eu lá na Montreux de Hermeto.
Do nada que sou ela surge com sua feição de mar bravio noturno, seu rosto agradável de lua cheia, seus olhos altivos de corça com as pupilas dilatadas, brilhando de excitação.
Nunca vira nada igual. Verdade, nunca!
Tinha eu a certeza de que não era um ser humano: era qualquer outra coisa próxima de um espetáculo escandaloso da natureza.
Era qualquer outra feito a mágica expressão de sensualidade e beleza: inacessível e deificada.
Cheia de graça acendeu toda minha cupidez. Quanto mistério naquela hora!
Tentei me certificar daquilo tudo: o seu jeito de quem não tarda amanhecer gozos de altruísmo, a sua memorável candura, a sua herança na aura magistral com carga de sofrimentos. Quanta majestade, elegância e realeza ao meu alcance.
Incrédulo, não conseguia desgrudar acompanhando todo seu trajeto.
Ah, quanta maravilha e satisfação essa mulher exalava para meu ser ínfimo e inútil.
Não acreditei mesmo e nem podia acreditar naquilo tudo. Só podia ser a minha sina de amar demais, de querer demais, de enlouquecer demais por amor e sempre pregando mais uma peça comigo. Não podia ser outra coisa, não podia ser. Impossível.
Eis que a cada passo ela cadenciava emanações afetuosas prometendo requebros recônditos capazes de me aprisionar na sua lascívia que saltava aos olhos.
A cada gesto havia sempre um fervor que escapava a me prometer orgasmos demolidores e loucuras estonteantes.
A cada olhar afogueado me incendiava as imediações e eu cada vez mais vítima na procela dos seus encantos.
Será possível? Não, não podia ser. Mas era.
O inacreditável é que ela me goderava circunvagando crestada com a graça do cisne e mais pronunciava o realce inesgotável de todo seu aprumo na névoa do devaneio.
O inexplicável é que ela irradiava deslizando a língua de camaleoa sobre o batom cálido dos seus lábios rubros e carnudos, oh! boca sedutora de Padmini linda e graciosa.
O inenarrável é que ela contornava o campo gravitacional para cravar nosso fuso-horário no meridiano de Greenwich.
Tudo isso para mim, eu cobaia de sua feitiçaria!
Não podia ser... não podia ser.
Não acredito em milagres, mas aquilo era algo parecido com o imensurável além da compreensão, não podia ser outra coisa. E quanto mais eu me embebedava com o seu flerte mais ela circulava no meu deslumbramento, slow motion, impune e desejada. E quanto mais eu ensandecia mais ela me provocava insinuando avançar rente ao meu sexo. E quanto mais eu entorpecia mais ela preparava o bote traçando uma circunferência com diâmetro entre perto e longe, ao meu redor. E quando seu feitiço cingiu meu peito, ela aproximou-se esquiva com o hálito perfumado das deusas incorpóreas, com o suspiro dos graus de sua paixão, com o suor das querências no verdadeiro eflúvio do corpo de mulher.
Tudo névoa de devaneio.
Manteve-se, então ela, eqüidistante entre o meu e o seu latente desejo, imantando a minha gula.
O seu olhar tácito ateava-me na provocação por incursões estratégicas por invadir-lhe completamente o corpo e a alma.
No sétimo movimento, a quarta esfera da criação cabalística fez-se luz na pira do amor ardente e insólito, surgida entre os nossos corpos perpétuos e mútuos de paixões avassaladoras.
As chamas do amor vinham como que aflogístico imorredouro.
A minha cabeça rodava. Ela inteira, linda e maravilhosa. Na minha frente! E no meio dessa labareda fitamo-nos um ao outro. Ela encostando-se no nada, por onde se elevou gradualmente uma pedra, deitando-se para que eu pudesse ficar a par de tudo, girando espalmada em decúbito dorsal. E girando mais para maior embriagues com suas vestes se esfacelando para a nudez integral. Enfim, num átimo estaciona toda loucura com seus pés ao meu alcance e todo corpo à minha frente.
Tomei a rédea sobre o seu corpo dúctil, plantei-me no fogo invisível de sua carne e comecei a me apossar daquilo tudo acariciando seus pés, tornozelo, tateando o seu tendão de Aquiles, tocando a sinuosidade de suas pernas longas da maturidade, depilada, refinada, impetuosa, estouvada.
Havia todo tipo de provocação na sua pele fina e íntegra de lótus, no corpo aveludado da flor de mostarda que mais se fazia uma fonte plena de prazer.
Não me contive e com os nervos excitados mordi sua coxa. Depois rondei a vertigem das suas pernas, beijei-lhe os joelhos, lambi suas reentrâncias no anseio de explorar o aclive do seu triângulo da luxúria. Eu, limítrofe do prazer naquele rolho; ela, buliçosa e súplice no ustório da paixão.
Ah, como eu me deleitava com seus movimentos espasmódicos, seus agudos gemidos, seu estrebuchamento incontido, enquanto eu passava meus lábios e minha língua pela cobertura de suas entrepernas, pela sacada do seu yoni, do seu botão de lótus entreaberto perfumado como o lírio recém-desabrochado, aquele odor gostoso, o conteúdo atrativo para o meu apetite insaciável por seu colo rijo, cheio e ereto.
Ah, como eu saboreava o ventre achatado dos amantes, na linda anatomia de sua região pélvica-abdominal, o seu monte de Vênus desejado. E seguia insaciável para remexer nas suas entranhas, pelas suas ninfas, pelo capuz do clitóris, seu freio, o púbio, as carúnculas himenais, o períneo, o orifício, o intróito, a cavidade uterina, toda a sua plataforma orgásmica.
Ali estava enteu, a fruta boa de chupar, a sua drupa. A minha língua era o seu manzape; suas entranhas, as encubas; e o seu prazer, o bilbode.
Ah, minha cinegética ambição ali nesse repasto regalado e sobejando o fluído de sua fonte no platô do seu prazer, deflagrando o limiar na maior ebulição pelas veredas interestelares, curando seu talho com a minha prece de amor. Era doce o seu gemido, era glorioso o seu entregar: arfante e alvoroçada até explodir violentamente e a se jogar por inteiro no meu prazer abissal. O gozo, nossa festa.
Fez-se quieta de repente e fitou-me com uma carinha de anjo. Presenteou-me um riso libertino de hetaira gratificada. Aí, beijou-me a boca com a sede eterna dos mortais.

© Luiz Alberto Machado. Direitos Reservados.

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