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Venus e Adônis (c.1597), do pintor do Maneirismo Flamengo, Bartholomeus
Spranger (1546-1611).
PAIXÃO
Falar em química da paixão e do amor em nossos dias,
confronta a dicotomia da racionalidade com a emotividade. Principalmente pela
atitude experimentalista e pelo sucesso tecnológico que propiciaram um desigual
conforto humano. Contudo, enquanto o conforto passa a ser a razão da saga
humana hoje, engendrou-se o desconforto para o conhecimento, que impôs a si
mesmo limites metodológicos e restrições de incidência, que o paralisaram em
campos onde o experimento não pode operar. Nesses campos do amor e da paixão, a
ciência cotidiana não entra e os considera o limbo da metafísica, o exagero da
imaginação artística e a perfumaria opressora dos mitos superados. Dessa forma,
falar de amor e de paixão em tempos de banalização e vulgarização das relações
afetivas e sexuais, requer um exercício ético sem preconceitos.
Se no interior da própria ciência, a razão se autotematiza, no
cotidiano, a opacidade continua. Há um mundo operatório que dá conta dos
interesses e racionaliza as correlações de força vigentes, mantendo e
justificando as disparidades, aquietando as consciências, criando virtualidades
consoladoras e simulacros generosos, galvanizando as atenções e os esforços. Para
um mundo limpo, tão limpo como as máquinas, cuja sujeira é permitida por não
ter o odor e a organicidade dos seres vivos, uma razão limpa, sem as
instabilidades do afeto e os riscos da paixão. Enquanto isso, uma corrente
inglória e contumaz, insiste na afetividade em detrimento do mecanicismo
desumano. Para que essa razão analítico-instrumental sobreviva, será sempre
preciso separá-la do afeto. A inteligência mais alta é aquela que tem a
eqüidistância dos eunucos e a limpidez da água destilada. Isto significa uma
muralha construída entre a razão e a paixão, entre a cognição e a afetividade,
a se tomar a terminologia piagetiana. O mundo do dado, como se insurgindo, não
cansou, na história, de mostrar que onde a razão brilha, há uma coexistência
com a paixão, onde ela desvela, ali está morando o afeto. Isso pode ser
observado, tanto individual, quanto coletivamente.
A paixão, em Nietzsche, martela e fragmenta, atingindo a
transmutação de todos os valores. Em Marx, subverte, denunciando a injustiça
das estruturas econômicas e sociais. Em Freud, revela o inconsciente; e, no
feminismo, desprivatiza o privado para denunciar a desigualdade entre os sexos.
E isso quer dizer que não há Einstein sem a paixão pelo Universo, nem Mozart,
sem a paixão pela Música, nem Marx, sem a paixão pelos desvalidos, nem Picasso,
sem a paixão pela forma, cor e textura, nem movimentos sociais, sem a paixão
pela transformação. Daí, conforme Gutiérrez (1998:80), "(...) paixão é
criatividade: sem paixão não há poema, quadro, catedral, transformação social
ou literatura. E é da paixão amorosa que trata a literatura, especialmente a
romântica".
Em Goethe, com Werther, é a mais alta representação do amor
impossível, do amor infinito e da morte. Onde a paixão é excesso, transgressão.
E que as transgressoras, adúlteras, ou não, como as heroínas na história da ópera,
sofrem sempre algum tipo de punição. A paixão sem qual o mundo é insípido, a
paixão que alimenta e fecunda e sem a qual se perde a própria flor da vida,
tendo as características do que, para Kant, é o sublime, pois em termos
kantianos o sublime é noturno, tempestuoso, misterioso. Mas afastar a razão da
paixão é útil para efetivar uma dominação sutil: a dominação que estimula a
produção com a diminuição de angústias e tensões, a dominação dos controles
mais fáceis, dada a previsibilidade dos seres com sentimentos pequenos e pouco
intensos, a dominação da criação de necessidades para amortecer dúvidas e tecer
existências lineares, que procuram se apropriar de mercadorias, em si,
desnecessárias. Além disso, nessa teia de poderes estabeleceu-se uma outra
dualidade: a do amor, de um lado, e o da paixão, de outro. Para o amor foram
carreadas todas as qualidades superiores: o amor é construtivo, o amor é
solidário, o amor é doação, o amor é o sentimento da união serena e estável.
À paixão foram reservados os estigmas do descontrole, da traição,
da agressividade, da infelicidade, da imprevisão e da destruição. Assim, a
paixão se tornou fonte de atos perigosos, como, no âmbito penal, o homicídio
passional.
O amor-paixão que move o ser humano para pontos cruciais, que o
lança para os abismos, ou que o abre para iluminações, é entrega plenificadora
ou destruidora. Seu sentido plenificador ou destruidor está dependente do
valor, está ligado aos projetos, está demarcado por trajetórias individuais,
sociais ou culturais. Ele é demasiadamente humano. Por isso, é perigoso para a
sociedade de controle. Somente humano. No entanto, é preciso entender que o
amor e a paixão fazem parte da vida humana porque estão sempre presentes nos
sentimentos humanos.
Para os poetas arrebatados a paixão não é, sente-se! E sente-se a
cada momento, a cada beijo, a cada carinho, a cada sofrimento. Paixão é o que
se cria fechados no mundo onde se balbucia palavras divinas que os beijos
inocentemente interrompem! Paixão é a contemplação mística de olhar os olhos
enobrecidos de prazer, de vida. Por isso e muito mais, a química do amor e da
paixão é muito estudada hoje, pois o corpo produz substâncias que são como
drogas que agem na pessoa quando está apaixonada.
Numa primeira tentativa conceitual empírica, a paixão pode ser
entendida como um sentimento que desestrutura o indivíduo, pois ele deixa de
lado o seu próprio eu para satisfazer as vontades e desejos do outro. Isso
porque o apaixonado se anula, esquece de si mesmo para viver a vida do outro.
Afasta-se dos amigos, da família e as vezes da própria sociedade. Ou seja, a
paixão é a forma de amor que recusa o imediato e foge do próximo: aspira à
distância e a inventa na medida de sua necessidade, para melhor se renovar e se
exaltar. Esta definição está conforme com os preceitos do filosofo francês
Denis de Rougemont, autor de "Os mitos do amor".
A paixão, por outro lado, é uma projeção narcisística: ama-se, no
outro, a projeção de si mesmos, enquanto o casamento, por seu lado, elimina o aspecto
nascisístico da relação (Bolsanello, 1979). O apaixonado projeta e enxerga no
outro tudo que ele deseja ter ou ser. A paixão não dura a vida toda. Ela chega
numa encruzilhada onde encontra dois caminhos a seguir: acabar ou
transformar-se num grande amor.
Por outro lado, Jung (1980), observa que o encontro de duas
personalidades é como o contato de duas substâncias químicas: se houver alguma
reação, ambas serão transformadas. Por isso, entende-se que a paixão é aquela
euforia, aquele tormento, as noites insones e os dias inquietos. Em êxtase ou
tomados pela apreensão, sonhando acordados durante os afazeres, esquecendo as
coisas, perdendo a noção do espaço, ficando sentados ao lado do telefone ou
planejando o que vamos falar, obcecados, ansiando pelo próximo encontro com a
pessoa amada. Sob esse entorpecimento, o riso deixa tonto, enfrenta-se riscos
absurdos, diz-se tolices, ri-se demais, revela-se segredos bem guardados,
conversa-se a noite inteira, anda-se pela madrugada e, o tempo todo, abraçam-se
e beijam-se, esquecidos do mundo inteiro enquanto estão tomados pela febre e
sem fôlego, plenos de êxtase (Fisher, 1995).
Numa outra visão, Freud considerou a paixão como um desejo sexual
bloqueado ou postergado. Daí, muitos consideraram a paixão uma experiência
mística, intangível, inexplicável e até sagrada, que desafia as leis da
natureza e a investigação científica.
Há toda uma mística, desde Iansã, que é o orixá de um rio
conhecido como Níger, cujo nome original em iorubá é Oyá. Deusa da espada do
fogo, dona da paixão, Iansã é a rainha dos raios, dos ciclones, furacões,
tufões, vendavais. Orixá do fogo,
guerreira e poderosa. Mãe dos eguns, guia dos espíritos desencarnados, senhora
do cemitério. Orixá da provocação e do ciúme. Paixão violenta, que corrói, que
cria sentimentos de loucura, que cria o desejo de possuir, o desejo sexual. É a
volúpia, o clímax. Ela é o desejo incontido, o sentimento mais forte que a
razão. A frase "estou apaixonado" tem a presença e a regência de
Iansã, que é o orixá que faz com que os corações batam com mais força e cria
nas mentes os sentimentos mais profundos, abusados, ousados e desesperados. É o
ciúme doentio, a inveja suave, o fascínio enlouquecido. É a paixão propriamente
dita. É a falta de medo das conseqüências de um ato impensado no campo amoroso.
Iansã rege o amor forte, violento. Oyá é também a senhora dos espíritos dos
mortos, dos eguns. É a deusa dos cemitérios. É ela que servirá de guia, ao lado
de Obaluaiê, para aquele espírito que se desprendeu do corpo. É ela que
indicará o caminho a ser percorrido por aquela alma. Comanda a falange dos
Boiadeiros. Embora tenha sido esposa de Xangô, Iansã percorreu vários reinos.
Foi paixão de Ogum, Oxaguian, Exu. Conviveu e seduziu Oxóssi, Logun-Edé e
tentou, em vão, relacionar-se com Obaluaiê. Em Ifé, terra de Ogum, foi a grande
paixão do guerreiro. Aprendeu com ele e ganhou o direito do manuseio da espada.
Em Oxogbo, terra de Oxaguian, aprendeu e recebeu o direito de usar o escudo.
Deparou-se com Exu nas estradas, com ele se relacionou e aprendeu os mistérios
do fogo e da magia. No reino de Oxóssi, seduziu o deus da caça, aprendendo a
caçar, tirar a pele do búfalo e se transformar naquele animal com a ajuda da
magia aprendida com Exu. Seduziu o jovem Logun-Edé e com ele aprendeu a pescar.
Iansã partiu, então, para o reino de Obaluaiê, pois queria descobrir seus
mistérios e até mesmo conhecer seu rosto, mas nada conseguiu pela sedução.
Porém, Obaluaiê resolveu ensinar-lhe a tratar dos mortos. De início, Iansã relutou,
mas seu desejo de aprender foi mais forte aprendeu a conviver com os eguns e
controlá-los. Partiu, então, para Oió, reino de Xangô, e lá acreditava que
teria o mais vaidoso dos reis, e aprenderia a viver ricamente. Mas, ao chegar
ao reino do deus do trovão, Iansã aprendeu muito mais. Aprendeu a amar
verdadeiramente e com uma paixão violenta, pois Xangô dividiu com ela os
poderes do raio e deu a ela o seu coração. O fogo é o elemento básico de Iansã.
O fogo das paixões, da alegria, o fogo que queima. E aqueles que dão uma
conotação de vulgaridade a essa belíssima e importantíssima divindade africana,
são dignos de pena e mais dignos ainda, do perdão de Iansã.
Doroty Tennov, em 1960, identificou uma constelação de
características comuns à condição de se estar apaixonado, um estado que ela
chama de envolvimento, alguns psiquiatras chamam de atração e outros de paixão
(Fisher, 1995).
O primeiro aspecto dramático dessa condição é seu início, o
momento em que outra pessoa começa a assumir um significado especial. Depois, a
paixão vai se desenvolvendo segundo um padrão característico, que começa com o
pensamento invasivo. No começo, esses pensamentos invasivos ocorrem de maneira
irregular. Mas se detém nos aspectos mais triviais da pessoa amada e a aumentar
desproporcionalmente sua importância em um processo que Tennov denomina de
cristalização (Fisher, 1995). A cristalização é distinta da idealização, pois a
pessoa apaixonada na verdade percebe os pontos fracos da pessoa a quem
idolatra.
As duas características mais importantes que aparecem nas
divagações dos informantes apaixonados de Tennov são duas sensações
esmagadoras: a esperança e a dúvida (Fisher, 1995). A timidez, o medo da
rejeição, a ansiedade e o desejo de reciprocidade, são outras sensações importantes
da paixão. Acima de tudo, há um sentimento de desamparo, uma sensação de que
essa paixão é irracional, involuntária, não-planejada e incontrolável. Dessa
forma, a paixão passa a ser um conjunto de intensas emoções que se desencadeiam
sobre as pessoas e as inundam, deixando-as à mercê dos caprichos da outra
pessoa, em detrimento de tudo o que os rodeia, incluindo o trabalho, a família
e os amigos. E este mosaico de sensações involuntárias só está parcialmente
relacionada ao sexo (Fisher, 1995).
A paixão, ainda, pode ser desencadeada, em parte, por um dos
traços mais primitivos - o olfato. Cada pessoa tem um cheiro diferente. Todos
têm um odor pessoal, tão característico como a voz, as mãos, o intelecto
(Fisher, 1995). O corpo humano pode produzir os mais poderosos afrodisíacos
olfativos. Tanto os homens quanto as mulheres têm glândulas apócrinas nas
axilas, em volta dos mamilos e na virilha, que se tornam ativas na puberdade. A
secreção dessas glândulas difere daquela das glândulas ecrinas, que se encontram
na maior parte do corpo e produzem um líquido inodoro, porque seu exudato,
junto com as bactérias existentes na pele, produz o cheiro acre e azedo da
transpiração (Fisher, 1995). Os odores masculino ou feminino podem provocar
fortes reações físicas e psicológicas. O cheiro de um homem ou de uma mulher
podem trazer à tona muitas lembranças. Despertada a paixão, o cheiro da pessoa
amada, torna-se um afrodisíaco, um estímulo contínuo ao relacionamento amoroso.
Certo distanciamento é essencial para a paixão. Em geral, as pessoas não se
apaixonam por alguém que conhece bem. O mistério é muito importante para o amor
romântico. As dificuldades também parecem despertar essa loucura. É a caçada.
Se uma pessoa é difícil de ser conquistada, isso desperta o interesse das
outras. A ocasião também desempenha um papel importante na paixão. Via de
regra, sente-se atraído por pessoas similares, tendendo a procurar pessoas
semelhantes, o que os antropólogos chamam de união positiva entre iguais
(Fisher, 1995). É a constelação de fatores que aparecem de uma vez, incluindo o
momento oportuno, os obstáculos, o mistério, as semelhanças, um mapa amoroso
coincidente, e até os cheiros certos,
que torna a pessoa suscetível a se apaixonar. Esse violento distúrbio
emocional que se chama paixão ou atração pode começar com uma pequena molécula
chamada feniletilamina, ou FEA. Conhecida como a amina da excitação. A FEA é
uma substancia existente no cérebro que provoca as sensações de exaltação,
alegria e euforia.
No aspecto biológico, os impulsos são os mesmos, com manifestações
orgânicas concretas. A falta de controle desses impulsos faz a diferença, influenciando
os aspectos psicológico e social, muito ligados.
Na raça humana centros cerebrais superiores dominam sobre os
centros sexuais e o sexo reprodução muitas vezes se curva perante a
complexidade do sexo prazer e o do sexo amor.
Os feromônios, certos odores nas fêmeas de animais, começam a ser
estudados na espécie humana e já se conhece um pouco sobre uma detecção
inconsciente dessas substâncias que estimulam a produção de outras substâncias
cerebrais como a ocitocina, na hipófise, responsável pela produção de leite,
contrações do parto e uma espécie de fome epidérmica: uma agradável sensação
desencadeada pelas carícias em qualquer região do corpo.
A ocitocina facilita a ação dos feromônios durante o contato
mãe-bebê logo após a parto estabelecendo a memória olfativa. Estas lembranças
precoces ficam registradas de modo indelével na mente e vão influenciar todos
os relacionamentos futuros, funcionamento na sociedade e capacidade de receber
e dar carinho. Este argumento é reforçado pela psicologia da evolução.
Não há dúvidas que processos complexos como as fantasias e
palácios são mais relevantes no estabelecimento dos encontros e, acima de tudo,
o amor ágape é o grande amálgama divino indissolúvel pelo imperfeito homem, mas
uma reflexão é para que os casais redescubram as agradáveis e inebriantes
sensações proporcionadas pelos seus hormônios. O excesso de aromas oriundos dos
banhos aromáticos, óleos, perfumes podem mascarar os feromônios. Portanto, não
se deve subestimar ação hormonal: muitos casais enfrentam desgastes relacionais
profundos durante a gestação ou menopausa por desconhecerem as alterações
físicas provocadas pelos hormônios. Jovens maridos, que tinham um
relacionamento prazeroso, muitas vezes, sentem-se desprezados durante a
gestação pois as esposas já não parecem tão interessadas neles. O casal se distancia e surgem mágoas. O
problema é facilmente superado quando informamos que a gestante fica com o
desejo sexual diminuído principalmente devido a elevação passageira da
prolactina, um hormônio que estimula a lactação. A resposta sexual é normal
desde que o marido continue a procurar a intimidade. Por isso, para o terapeuta
familiar Robert Neuburger, a paixão altera a percepção da realidade por causa
do o abandono da vigilância. Segundo ele, a paixão invade, pode fazer com que a
pessoa negligencie os filhos, o trabalho, tudo. A paixão se organiza dentro da
ansiedade e da urgência. O sentimento primordial é a necessidade absoluta do
outro. E esse estado precede o encontro
com a pessoa que vai se transformar no objeto da paixão. Corresponde à
necessidade de se sentir vivo. Geralmente, as pessoas se apaixonam quando estão
se sentindo mal, insatisfeitas consigo mesmas e com os outros. Nessas
situações, uma paixão faz a pessoa sentir que está vivendo intensamente. Claro
que não se pode negligenciar a escolha da pessoa por quem se vai ficar
apaixonado, mas o mecanismo passional vem antes. É acionado quando se começa a
desejar algo que traga uma nova energia vital.
A paixão toca no que existe de mais profundo na existência de cada
um. É uma autoterapia excelente e um antidepressivo muito eficaz, vez que ela
está ligada à vida e à morte. Ter amado passionalmente permite aceitar a morte.
Mas não se deve ultrapassar a dose. Há um aspecto mortífero na paixão. Os
apaixonados tendem a ir além de suas forças, com uma percepção alterada da
realidade. O resto do mundo não existe mais, e isso não pode durar para sempre.
Depois, tudo vai depender da maneira como a pessoa aterrissa: devagarinho, com
lembranças maravilhosas, ou com amargor e arrependimento. A menos que a paixão
se transforme em amor duradouro.
O namoro, por exemplo, é um dos modos que o ser humano encontrou
no decorrer de sua existência para descobrir-se como ser sensível, capaz de
trocar emoções, sentimentos, carícias, em relação a si mesmo e ao outro. É um
fenômeno conhecido por todos, podendo ser "rapidinho"
descompromissado, como o "ficar", ou duradouro, envolvendo
compromissos até de fidelidade. A adolescência materializa e demarca o seu aparecimento.
E a morte, o seu fim. Com isso, diz-se que o ato de cativar, inspirar amor,
atrair, namorar, só cessa com a finitude: a morte. Ocorre por infinitas razões:
atração sexual, afinidades, paixão, curiosidades, carência afetiva, medo de
ficar só entre tantos outros motivos, até buscando vivenciar essa forte emoção.
O enamoramento é um estado de ser, que lança a uma experiência extraordinária,
transgressora. Graças à transgressão desencadeada pela força de Eros, o deus do
amor e do movimento para a mitologia grega, a libido para a psicanálise,
encontra-se o fenômeno da mestiçagem entre os mais variados tipos étnicos. Nesses
momentos de enamoramento, os envolvidos se percebem possuídos por uma emoção,
uma força nascente, uma revelação diante do objeto de desejo, que os mobilizam
a um renascimento, a uma redescoberta física, sexual, emocional e psíquica. É
que a paixão tende a superar a diversidade existente entre as duas pessoa,
razão de ser do próprio desejo. O interesse pelo outro está focado no que o
apaixonado atribui ao outro de diferente. Assim, passa-se a atribuir ao eleito
do desejo uma qualidade singular, o que é revelado pela intensidade e
intimidade erótica que adquirem o seu gesto, seu toque, seu cheiro e suas
carícias. Carícias erotizam para sempre o corpo. Nesses momentos, o desejo de
estar no corpo do outro permite mergulhar no fantástico mundo da criatividade,
liberar os horizontes do imaginário e, numa viagem sem fronteiras, possibilitar
à pessoa amada o seu desvelar. Essa viagem de descoberta é vivida a dois, pois,
ao permitir o desvelar-se da pessoa amada, desvelam-se também diante dela. Nessa
fusão se completam e, por instantes, experimentam a eternidade. São momentos de
beleza incontestável . O êxtase, a magia se presentificam.
Outro aspecto interessante do enamoramento é a percepção alterada
da duração do tempo: as horas passam em minutos e os minutos estendem-se como
se fossem horas. O encontro ocorre quando os dois conseguem operacionalizar o
tempo. Há, portanto, uma preparação criativa, uma predisposição para viver o
extraordinário, as festas, os espetáculos não ocorrem todos os dias. Nessa
fantástica e instável caminhada existencial, Eros mostra-se sempre paradoxal:
não oferece certezas e tampouco garantia de estabilidade, e continuidade. Ao se
permitir viver o processo de enamoramento, portanto, estão-se expostos a serem
invadidos por fortes ventos que, por certo, irão desestabilizar a fusão , e a
tão sonhada completude , que se atribui ao outro o poder de possibilitar-se a
viver. Afinal, sonhos são estados de ser dos mortais. Com certeza: um consolo,
um prêmio pela nossa condição de mortais. A sedução é o ponto de partida para
se atingir a paixão. O outro completa, atrai e, a partir daí inicia a paixão.
A palavra sedução é muitas vezes, utilizada com uma conotação
negativa. No entanto, dentro de certos limites, a sedução é um processo normal
e desejável nos relacionamentos humanos. A sedução é um jogo que tem como
principal característica a formação de um sentimento diferente de todos os
outros, que vai prendendo o seduzido sem que ele perceba. Existem, pois,
diferentes maneiras de se praticar a sedução, como: fingir que não está
percebendo a intenção do outro ou fingir preferências comuns. Na realidade o
apaixonado não busca o outro, busca a si mesmo. O olhar sedutor transcende os
limites do simples olhar, é um olhar colorido,
cheio de promessas. Todo ser humano de uma maneira ou de outra se sente
incompleto e deseja buscar em outra pessoa o que lhe falta. A paixão, a
sedução, não se liga a matemática, não tem idade. A intensidade da emoção
sentida durante a fase da paixão, por si só justifica qualquer conseqüência
negativa sofrida mais tarde. A paixão da qual nasce o ciúme é o desejo de
posse. É fato estranho que a emoção mais sublime conhecida pelo homem, e, bem
asism, pelo animais, é o amor. As maiores coisas realizadas pelo homem, são
feitas devido aos impulsos do amor. Contudo, o própiro amor pode criar
expressões de duas paixões muito opostas, a saber, a paixão de dar e partilhar
aquilo que se ama, e a paixão de possuir e controlar a coisa amada.
O amor é uma experiência consumptiva. Mergulha-se euforicamente
nesta deliciosa tortura onde freqüentemente é difícil manter a concentração.
Outros estudiosos identificaram algumas substâncias responsáveis
pelo amor: dopamina, feniletilamina e ocitocina. Estes produtos químicos são
todos relativamente comuns no corpo humano, mas são encontrados juntos apenas
durante as fases iniciais do flerte. Ainda assim, com o tempo, o organismo vai
se tornando resistente aos seus efeitos e toda a loucura da paixão desvanece
gradualmente, quando a fase de atração não dura para sempre.
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