Paradise Lost (A expulsão de Adão e Eva
do Jardim do Paraíso), óleo sobre tela por Alexandre Cabanel (1823-1889,
France)
O PAPEL DA SEXUALIDADE NO DESENVOLVIMENTO DA
PESSOA – No seu livro Psicanálise e Pediatria, a médica e pediatra francesa
Françoise Dolto (1908-1988), entre outros tantos importantes assuntos, aborda o
papel da sexualidade no desenvolvimento da pessoa, o sexo, a libido, o
hedonismo, as fases de desenvolvimento dos instintos, a masturbação, complexo
de castração, pulsões, instâncias da personalidade, o consciente e o
inconsciente, recalques, resistências, pensamento, inteligência, sexualidade
normal e perversa, as interdições e a masturbação. Destacamos algumas expressões
da autora:
“[...] em
cada idade, desde o nascimento à morte, não há pensamento, sentimento ou ato do
individuo que não comporte em si a busca hedonista, isto é, uma pulsão libidinal.
Não existe vida sã sem vida sexual sã e, inversamente, não há vida sexual sã
num individuo doente ou neurótico. A saúde sexual não se mede pela atividade erótica
fisiológica do individuo; esta constitui apenas um dos aspectos da sua vida
sexual. O outro aspecto é o seu comportamento afetivo em face do objeto de
amorosidade, o qual se traduz, na ausência desse objeto, pelos fantasmas em que
ele intervém. Só o estudo desses fantasmas e do seu simbolismo permite
conhecermos a idade afetiva do individuo e o modo de sexualidade que preside à
sua atividade. Não existe atividade que não seja sustentada afetivamente pelos
sentimentos, em relação com a finalidade consciente ou inconsciente dessa
atividade. E o objetivo de toda educação (profilaxia dos distúrbios de
comportamento), como de toda psicoterapia (cura dos distúrbios do
comportamento), é a utilização da libido de individuo de maneira que ele se
sinta feliz e que esse bem-estar subjetivo se harmonize com os dos outros e
inclusive o promova, em vez de sustá-lo [...] é a energia libidinal derivada de seus fins sexuais, que anima todas as
atividades do individuo”.
“[...] as
pulsões e descargas libidinais só são intrinsecamente importantes em virtude
dos afetos que elas engendram [...] Mas
as pulsões instintivas da criança deparar-se-ão com obstáculos. Se esses obstáculos
são consentâneos com a condição humana, tomada em sua mais ampla acepção, ou são
levantados sem necessidade racional pelo meio familiar, cuja atitude decorre de
uma ótica moralmente deformada, é algo de que a criança não está apta a aperceber-se.
Ela se aperceberá um dia, na puberdade ou mais tarde, de que as suas veleidades
de rever os valores elevados à categoria de dogmas pelo seu meio educacional e
pelo seu próprio Superego criarão conflitos entre o seu senso moral e o seu
Ego. Essa revisão de valores, na puberdade afetiva, é entretanto, indispensável.
[...] É por isso que esses conflitos da
adolescência, quer se passem na idade fisiológica ou mais tarde, se o individuo
já é ligeiramente neurótico antes da puberdade, isto é, culpado de seus sobressaltos
sexuais, poderá desencadear neuroses mais ou menos agudas [...]”.
“[...] Todos
os que se ocupam de desordens do comportamento, de perturbações funcionais orgânicas,
os educadores, os médicos, no verdadeiro sentido da palavra, devem ter noções
sobre o papel da vida libidinal e saber que a educação da sexualidade é o
fermento da adaptação do individuo na sociedade”.
Adan and Eve II, da pintora francesa Erika
Meriaux.
FRANÇOISE DOLTO – A médica e pediatra
francesa Françoise Dolto desde a infância manifestava seu interesse em
tornar-se doutora da educação, observando os problemas das relações entre seus
pais e filhos. Aos doze anos, com a morte da sua irmã Jacqueline, ouviu dos
pais a preferência de que ela devia ter morrido no lugar da irmã, inclusive, os
pais a responsabilizaram por não ter rezado o suficiente para salvá-la. Na
adolescência, ela enfrentará as incompreensões de sua mãe, ao confessar suas
inclinações pela arte de esculturas, desenhos e aquarelas. Foi então estudar
Enfermaria, depois se matriculou na Faculdade de Medicina, tornando-se médica
de família e pediatra. Rompeu com um noivado arranjado pelos pais, originando
sintomas neuróticos e sentimento de culpa, o que a fez decidir por análise com
René Lafargue. Defendeu sua tese em Medicina, sobre o tema das relações entre a
psicanálise e a pediatria, em 1939, sendo admitida na Sociedade Psicanalítica
de Paris. A partir de então, publicou diversos livros sobre a temática da
psicanálise para crianças e adolescentes. Entre suas obras se encontram A
Psicanálise do Evangelho, livro que se tornou polêmico e foi criticado por teólogos
e psicanalistas, ao que ela retrucou: “Eu não poderia vislumbrar
de ser psicanalista se eu não fosse crente”. Casou-se em 1942 com o médico reumatologista Boris
Ivanovitch Dolto, fundando o Colégio Francês de Ortopedia e Massagem. Trouxe à
luz a castração simboligência, uma ideia acerca das marcas sancionadoras, que
promoverá o aparecimento da alternativa para uma boa maternagem no esquema e
imagem corporal da criança. Criou a Casa Verde em 1979 , em Paris, para abrigar
crianças de até 3 anos de idade, acompanhadas pelos pais, na busca de evitar
traumas na pré-escola. Conheceu Jacques Lacan em 1938 com quem ao longo de 40
anos passou a ser ambos considerados o casal parental influenciador das futuras
gerações de psicanalistas franceses. Ela lutou pela causa da criança em rádio e
televisão, até falecer em 1988.
REFERÊNCIA:
DOLTO, Françoise. Psicanálise e pediatria: as grandes noções da psicanálise. Rio de Janeiro:
Guanabara-Koogan, 1988.
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